A importância da Comunidade
Quando se tem claro que a catequese deve ser
entendida como parte integrante do processo de Iniciação à Vida Cristã fica
claro que se está falando de algo muito mais envolvente do que simplesmente
preparar alguém para receber esse ou aquele sacramento. O que está em jogo não
é somente a preparação para participar conscientemente de um rito, mas conseguir levar a pessoa a
viver de uma forma nova, totalmente em sintonia com as propostas de Jesus
Cristo.
Com o tema “A
catequese na renovação da pastoral orgânica”, Therezinha Cruz levou os
participantes da 3ª Semana Brasileira de Catequese a fazerem uma profunda
reflexão sobre onde se quer chegar com o trabalho catequético e quem é o
responsável por ele.
Ninguém é uma ilha para viver e decidir a própria
vida de forma isolada. Como a Therezinha nos lembrou, o próprio conjunto dos
Evangelhos mostra que temos, além das exigências pessoais, também as
comunitárias e as sociais e que, pelo fato dessas exigências se entrelaçarem,
fica evidente que não é possível querer se fechar em nenhuma delas. Por isso, “a
vida em comunidade é o espaço de alimentação que fortalece tanto o nível
pessoal como o social. Dai se vê que precisamos de uma catequese aberta a essas
três dimensões da vida e da ação de cada cristão. Elas não são terrenos
separados. Cada uma que faltasse prejudicaria as outras duas”.
Infelizmente é fácil constatar que em muitas
Comunidades a ação pastoral acaba acontecendo de forma solitária, quando
deveria ser realizada em equipe. É evidente que “são muitos os ganhos em vários
aspectos se, cada um com seu jeito e seu tipo de espiritualidade, todos
estivessem interessados e, de certa forma envolvidos, nos projetos globais da
comunidade”.
Uma catequese realmente preocupada com a vida
cristã da pessoa, vai se esforçar em integrá-la na vida da Comunidade onde
possa viver aquela comunhão que faz a Igreja acontecer em fidelidade ao Projeto
do Reino de Deus. Tal comunhão, porém, não acontece de forma automática, mas
deve ser construída a partir de vários fatores que precisam ser evidenciados e
iniciados já no processo catequético. Dentre eles é necessário destacar:
a.
A valorização das
pessoas na Comunidade: “Cada um é único, precioso e insubstituível na sua
originalidade. É percebendo as múltiplas riquezas que Deus distribui a cada um
que começamos a valorizar a magnitude que há no relacionamento humano, a
riqueza da diversidade... Não dá para evangelizar se ignoramos os outros
trabalhadores do Reino, se não nos conhecemos e não nos sentimos parte de um
conjunto”.
b.
O planejamento das
atividades, realizado em conjunto: “O verdadeiro planejamento participativo é
uma escola que educa a comunidade para a pastoral orgânica. Pode dar mais
trabalho no começo, mas é um caminho que vai se tornando cada vez mais
produtivo”.
c.
O necessário
aprofundamento bíblico para todos: “A Bíblia... trabalha o tema da ‘comunhão na
missão’ tanto pelo método usado na sua composição como por seu conteúdo. Não é
um livro uniforme, com um só ponto de vista; é obra feita em mutirão na qual a
mensagem se comunica a partir da história de todo um povo... É um conjunto de
visões – até bem diferentes – que devem ser compreendidas a partir de uma chave
de leitura contextualizada para que se perceba de fato o que Deus está querendo
comunicar. É diversificada nos estilos literários e não se preocupa só com
aspecto da vida... Mas a Bíblia também valoriza explicitamente a ‘comunhão para
a missão’; o povo é educado no seu conjunto para ser sinal da Aliança; Jesus
não evangeliza sozinho; as comunidades do começo do cristianismo são o local de
alimentação da fé”.
d.
A escuta produtiva
da voz da Igreja: são muitos os documentos produzidos pela Igreja, dos quais a
grande maioria acaba ficando desconhecido, apesar da riqueza que nos
proporcionam para o conhecimento e vivência da fé cristã hoje.
Com certeza não é possível querer que o catequista
sozinho consiga inserir a pessoa na Igreja tendo presente todos esses fatores
indispensáveis para a verdadeira comunhão. A própria Therezinha lembrou que “já
dizia em 1983 o nosso (documento) Catequese Renovada: ‘cada membro do corpo
eclesial é responsável pelo bom andamento do todo, e o corpo sadio ajuda o
crescimento de cada um. (...) Na comunidade eclesial todos têm a vocação comum
de construí-la e de torná-la cada vez mais eficaz em sua missão libertadora e
salvadora junto ao mundo’. (CR 256 e 257)”.
Portanto é necessário que os mais variados grupos,
movimentos, pastorais, espiritualidades e visões de Igreja, que em muitas
Comunidades acabam convivendo lado a lado, mas sem muito diálogo entre si,
estejam dispostos a realizar um verdadeiro “ecumenismo interno”. É fundamental
que todos queiram ser “um” com os outros, assim como Jesus pediu, sem ficar
brigando para ver quem vai ser o maior no serviço ao Reino, mas alegres por
fazerem parte da multidão de fiéis com um só coração e uma só alma (cf. At
4,32). Dessa forma, além de todo o esforço do catequista, a própria Comunidade
estará sendo o ambiente propício para que aconteça uma verdadeira e eficaz
iniciação à vida cristã de seus candidatos.
A Iniciação à Vida Cristã e o Discipulado 1
O Diretório Nacional de Catequese afirma muito
claramente que “o fruto da evangelização e catequese é o fazer discípulos”.
Mais do que somente preparar as pessoas para receberem esse ou aquele
sacramento, é necessário ajudar os candidatos a chegarem a uma verdadeira
conversão a Jesus e ao seu projeto para o mundo.
Tal relação entre ser catequizado e transformar-se
em seguidor autêntico de Jesus foi muito bem desenvolvida durante o painel
“Discípulos Missionários hoje: Catequese, caminho para o discipulado”, que foi
apresentado por Dom Juventino Kestering juntamente com Ir. Vera Bombonato,
durante a 3ª Semana Brasileira de Catequese.
Entender a
catequese como caminho para o discipulado exige que façamos uma profunda
revisão e ampliação de horizontes sobre esse importante momento de
evangelização. Pois, como disse Dom Juventino, sem que se abandonem as crianças
e os jovens, é necessário que fique muito claro para todos que “os adultos são
os primeiros interlocutores e a preocupação básica do cuidado pastoral”. Além
disso, no mundo de hoje, marcado pela mudança de época, que questiona
profundamente a fé e o agir cristão, não se pode ainda conceber uma catequese que
simplesmente dê informações sobre a fé, a Igreja e os sacramentos.
De fato, na atual realidade brasileira, não é mais
normal que a transmissão da fé aconteça na família, na comunidade ou mesmo na
própria sociedade, como acontecia há tempos atrás. Hoje, os vários ambientes
proporcionam as mais diversificadas possibilidades de escolhas e isso acaba
exigindo que a transmissão da fé seja encarada como uma ação evangelizadora que
oferece uma opção muito clara e atraente.
Enquanto caminho para o discipulado a catequese tem
que ser entendida como uma ação evangelizadora que deve estar interligada a
“outros caminhos, como a liturgia, a dimensão social da fé, o ecumenismo, a
dimensão missionária” e, por isso mesmo, não acontece de forma isolada, mas é
um ato essencialmente eclesial. Somente assim conseguirá realizar sua missão de
lançar as bases da vida cristã naqueles que desejam seguir Jesus, através da
catequese de iniciação.
Segundo Dom Juventino, os catequizandos conseguirão
se transformar em autênticos discípulos missionários na medida em que passarem
por um caminho composto de vários passos: “é no caminhar, na persistência, na
busca, nas motivações, nas descobertas que a pessoa vai se encontrando com
Jesus Cristo, com a comunidade e com a missão. É importante o primeiro passo: o
Kerigma, o encontro entusiasmante com
Jesus Cristo. Mas é preciso caminhar para o segundo passo: A conversão, o
seguimento, a persistência, o aprofundamento. Mas não pode parar por aí. O
caminho é para um terceiro passo: O discípulo missionário, o engajamento, a
transformação da realidade, a sua inserção nas profissões, na família, no mundo
do trabalho, da política, das profissões e aí permear com os valores do
Evangelho, da ética e da cidadania”.
A realização desses passos vai exigir das
comunidades que todas as pastorais, grupos e movimentos trabalhem de forma mais
harmoniosa e orgânica, e somente assim se conseguirá que o processo de iniciação
à vida cristã aconteça de forma plena e eficaz.
A Iniciação à Vida Cristã e o Discipulado 2
Durante a 3ª Semana
Brasileira de Catequese, Ir. Vera começou lembrando a todos que o Documento de
Aparecida “destaca a iniciação cristã como a maneira prática de colocar alguém
em contato com Jesus Cristo e iniciá-lo no discipulado”. Isso provoca muitos
questionamentos e entre eles é importante se perguntar: “será que a nossa
catequese é um verdadeiro caminho de discipulado?”
“Discipulado” e “seguimento” são termos que se
entrelaçam na medida em que são identificados pela ação de caminhar ou seguir,
e acabam sendo utilizados indistintamente como sinônimos. Na realidade, como
bem distinguiu Ir. Vera, “seguimento expressa a ampla realidade do chamado de
Deus que entra na vida da pessoa, espera uma resposta e provoca uma ruptura”.
Por outro lado, “o discipulado expressa a relação vital entre a pessoa do
discípulo e o mestre Jesus”.
O processo catequético deve, em primeiro lugar
levar a pessoa a encontrar-se com o Jesus que convida “algumas pessoas do meio
do povo para segui-lo e partilhar com ele a vida, a missão e o destino”.
Somente quem acolhe esse convite é capaz de dar o passo seguinte, o do
discipulado, que é o “aprofundamento do seguimento e implica renúncia a tudo o que
se opõe ao projeto de Deus e diminui a pessoa; leva à proximidade e intimidade
com Jesus Cristo e ao compromisso com a comunidade e com a missão”.
Os verdadeiros “seguidores de Jesus participam de
sua vida, de suas atividades, particularmente do anúncio do Reino. Mas, eles
dependem plenamente de Jesus e agem em comunhão com ele. Sem a relação-comunhão
vital com Jesus, a pregação da boa-nova do Reino perde toda sua força de
transformação”.
Por isso mesmo, como bem lembrava Ir. Vera, “na
catequese, não é suficiente apresentar conteúdos sobre Cristo para serem
sabidos e aceitos, mas é importante propor um modo de conhecer Jesus, que
consiste em assemelhar-se a ele, segundo seus ensinamentos”.
Nessa mesma direção são muito significativas as
palavras do teólogo Jon Sobrino que afirma: “quem quiser conhecer Jesus e não
só ter notícia sobre ele, que o siga! (...) Quem quiser conhecer o mistério
cristão de Deus, que esteja disposto a permanecer diante de Deus, a viver e
atuar como Jesus! (...) Quem quiser saber da ação renovadora e vivificadora do
Espírito, que se coloque, como Jesus, entre os pequenos e os pobres!”
Todas essas afirmações a respeito de seguimento e
discipulado são elementos fundamentais do processo de iniciação à vida cristã. De
fato, a sua finalidade não é simplesmente a de aumentar o número de batizados e
encher Igrejas, mas a de formar verdadeiras comunidades de discípulos
missionários de Jesus Cristo, que se esforçam em viver as propostas do Reino de
Deus, contribuindo, assim para que esse mundo fique cada vez melhor.
Jesus: Discípulo e Mestre
Durante a 3ª Semana Brasileira de Catequese as
reflexões bíblicas, muito profundas e fáceis de assimilar, propostas pela dupla
Frei Carlos Mesters e Francisco Orofino, levaram os participantes a se
apaixonarem mais ainda por Jesus Cristo. Juntos, um completando o outro, sempre
de forma apaixonante, foram evidenciando principalmente alguns aspectos de Jesus
enquanto “Formando” e “Formador”.
É fundamental que todo catequista ou evangelizador
tenha Jesus como seu modelo inspirador. O problema é que muitos veem Jesus
somente como o Mestre que ensina com autoridade e se esquecem, que antes disso,
Jesus foi um formando bem aplicado. Afinal, se ele foi igual a nós em tudo,
menos no pecado, ele também teve seu processo de aprendizagem assim como todo
ser humano.
Carlos Mesters afirma sem nenhuma dúvida: “Jesus
foi um bom mestre, porque antes foi um bom discípulo; foi um bom catequista
porque foi um bom catequizando; foi bom formador, porque foi e continuava sendo
um bom formando. Falando de Jesus formando e formador, não se trata de dois
períodos distintos, como se nos trinta anos em Nazaré ele fosse só formando, e
nos outros três anos fosse só formador. Na realidade, o formando sempre é fator
de formação para seu próprio formador. O formador se forma formando seus
discípulos. O formando se forma convivendo com o formador”.
Fundamentalmente a escola de Jesus foi na família,
e na comunidade, onde foi conhecendo a história de seu povo através do contato
frequente com a Bíblia. Foi por causa de sua intimidade com a Bíblia, que Jesus
foi desenvolvendo sua experiência de Deus como Abba, Pai. Por isso, suas
palavras e gestos, nascidas dessa experiência de Filho, sem mudar uma letra
sequer, mudaram todo o sentido do Antigo Testamento. Mais do que falar sobre
Deus, Jesus irradiava para todos uma nova imagem de Deus que o animava por
dentro: não a imagem de um Deus severo, que impõe medo, mas de um Deus ternura,
que acolhe de forma amorosa e permanece na vida das pessoas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário